Carta para Ana

Meu amor, esta é uma carta comedida, singela como meus sentimentos atuais, contraditória, pois é carta de amor e amor tem dessas coisas. Começo pedindo perdão por não ter aprendido ainda escrever cartas, por não ter dignidade de entregar-te e com letra de próprio punho, minha covardia é grande, tão grande que te limito aos meus pensamentos.

Eu queria a todo custo te manter viva em mim, mas as vezes és só uma lembrança distante, perdida no tempo, agora já não penso em ti com tanta frequência, juro que isso me mata, um dia feliz para mim atualmente é aquele em que sinto uma vontade desesperada de te ver e quando esse dia chega eu percorro todas as ruas dessa cidade, todos os lugares que tu frequentas para tentar vê-la de longe, eu não tenho coragem de aparecer e dizer que te vi por acaso, mesmo quando te vejo sozinha, fumando um cigarro. Depois que te vejo eu vou embora, meu coração se acalma, você some dos meus pensamentos e começo a ficar ansiosa pelo dia em que sentirei saudades de novo.

Eu gosto de sentir tua falta, de me torturar, gosto de provocar a mim mesma, isso me dá a sensação de que continuas aqui no mesmo lugar, que a quero ainda com o mesmo amor, mas bem lá no fundo eu sei que as coisas já não são as mesmas, que um dia eu vou acordar e não vou pensar em ti, que não vou te ligar nesse dia, nem no outro, nem no outro e quando eu der por mim, já estarei a escrever tudo de novo para outra pessoa, aquela outra pessoa que vai ocupar o teu lugar, o bendito lugar que te dei, no meu coração.

Mas enquanto este dia não chega e enquanto este dia de saudade que é hoje também não finda, meu amor, quem me dera um abraço demorado no portão, um beijo roubado ou cedido ao teu singular poder de persuasão, quem me dera afagar teus cabelos, quem me dera um segundo te olhando nos olhos em silêncio.